Há muitos anos, num reino distante havia um juiz chamado Epaminondas, egocêntrico, postura imponente. Proferia longos discursos, apesar de vazios de conteúdo. Gostava de ser lisonjeado e de se sentir temido. Arrogante, não se importava com a verdade: preferia os aplausos, ser citado pela mídia, ser adulado, reverenciado. A justiça era sempre relegada a planos secundários.
Diante de casos
complexos, que demandariam investigação mais acurada, escolhia um culpado,
mesmo que sabia ser inocente. Seu objetivo único era mostrar e impor o seu poder.
Pessoas simples e desafetos habitualmente eram usados como bodes expiatórios para
externar a sua vaidade. Quando ele chegava ao tribunal o povo tremia, aguardado
para conhecer qual seria o veredito e quem seria a vítima.
Um dia, uma
senhora de idade avançada, foi apresentada ao Juiz Epaminondas, acusada de ter
furtado um pão para alimentar o seu neto. Incontinenti, de forma ditatorial e sem
deixar a defesa se manifestar, ele proferiu a seguinte sentença:
- A justiça
deve ser severa para quem infringe a lei. Declaro essa senhora culpada.
A senhora não
chorou, encarou o juiz com olhar sereno e disse pausadamente:
- Muito em
breve serás visitado pelo espelho da verdade, caro Juiz. E nele passarás a ver não
todas as falcatruas que cometes às escondidas.
Todos riram
muito. Epaminondas até se irritou com a ousadia da mulher, mas ignorou a suposta
profecia. Porém, no dia seguinte, apareceu um estranho espelho em sua sala. Estava
envolto em moldura sólida e refletia algo perturbador. Curioso, o Juiz olhou
para ele e ao invés de sua própria imagem, viu um pobre homem, curvado, acabrunhado,
olhar vazio. Nesse momento essa imagem falou:
- Este és tu, Juiz.
Tu que julgas apenas para alimentar o teu ego ao invés de fazer justiça. Doravante,
o sofrimento dos inocentes que condenaste te atormentará para sempre.
Assustado, Epaminondas
tentou quebrar o espelho, mas ele permanecia intacto. Tentou escondê-lo, mas
ele surgia em todo lugar. Sem poder fugir da própria imagem, enlouquecido, ele
começou a se esconder. Recusava julgamentos, com medo de ser visto seguido pelo
espelho. Pouco tempo depois abandonou o tribunal e começou a se esconder de
tudo e de todos, vagando sem rumo e sem destino. Dizem que ele ainda vagueia
por aí, buscando um reflexo que não o acuse. Mas o espelho da verdade, uma vez
mostrado, jamais se desfaz.
E, então, foi
eleito um novo juiz, justo, discreto e atento. E o povo voltou a acreditar na
justiça.
Moral da
estória: A justiça, quando usada para alimentar o ego, transforma o juiz
em prisioneiro do próprio reflexo.
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