sexta-feira, 4 de março de 2011

O TEMPO: realidade ou ilusão?

Desde o nascimento as pessoas iniciam um longo aprendizado. Aprendem a chorar, a mamar, a sorrir, depois a balbuciar as primeiras palavras, a engatinhar, a caminhar... E todas as demais pessoas que o cercam julgam ter algo importante para lhe ensinar.

Os primeiros anos passam. Surge a grande preocupação de preparar o rebento para a vida, para o futuro. Ingressa na pré-escola. Começa o ensino fundamental. Passa para o ensino médio. Ingressa na Universidade. Passa os anos da sua juventude sentado em bancos escolares. Aprende a ler. Lê muitos livros. Faz inúmeros exercícios. Aprende a escrever. Aprende a se comportar na sociedade, a falar com desenvoltura. Faz cálculos, domina outros idiomas. Enfim, assimila tudo o que se diz que contribuirá para a formação do homem maduro e moderno.

É imensurável a gama de informações despejadas sobre esse aprendiz. Aprende história, desde os tempos mais remotos, a idade da pedra, as conquistas, as guerras dos primeiros povos. Estuda os grandes pensadores, os filósofos, as Cruzadas, as aventuras gregas, o império romano, a formação dos países modernos, as alianças entre nações, e muito mais. Exigem-lhe conhecimentos profundos de geografia, decora o nome dos países, das suas capitais, de seus idiomas, religião, tamanho da população, rios, montanhas...

É minuciosamente testado sobre os feitos dos heróis do passado. Memoriza princípios e teorias descobertos por gênios de outros tempos e aprende até a aceitar alguns como definitivos e incontestáveis. Habitua-se a repetir o que outros disseram, fizeram, realizaram, criaram, com o compromisso de não se distanciar dos princípios básicos e fundamentais já definidos.  Em síntese, é grande a preocupação de rechear o seu cérebro de informações que, apesar de válidas, são limitadas, pois condicionam ao plágio e restringem a liberdade de criar e de inovar.

É dada pouca ou nenhuma importância ao desenvolvimento criativo do seu cérebro com o objetivo de prepará-lo para buscar princípios próprios, teorias novas, verdades ainda não reveladas. É como se tudo já tivesse sido dito, feito, criado, descoberto, sem nada mais restar para se criar, inventar, descobrir. Como se a inteligência humana tivesse chegado ao limite com o registro de escritos de grandes pensadores ou com o advento de descobertas que revolucionaram o mundo nos longínquos séculos que nos antecederam.

Existem fundamentos importantes que não se aprendem no decorrer desses anos todos. Princípios ocultos guardados em algum lugar muito recôndito do cérebro, os quais só vêm à tona se buscados com paciência, afinco, competência e muita persistência.

Dá-se muita ênfase à trilogia presente-passado-futuro, mas sem esclarecer suficientemente o seu significado. Incute-se grande importância ao passado dos outros e à preparação do futuro, reservando pouquíssimo tempo para o presente, que é o marco da vida de todos.

Com freqüência o passado é apresentado como a fonte do saber e, portanto, a parte mais importante da vida. Para muitos “ensinadores” o passado é a fonte de tudo, é a experiência, é a vida. Na seqüência, apresentam o futuro como algo de enorme importância, como objetivo da vida das pessoas. Assim, as pessoas aprender a pautar a sua vida na busca do saber descoberto no passado, para preparar o seu futuro. Nisso é consumido a maior parte do tempo de cada pessoa.

E do presente pouco se fala. Pouca importância é reservada ao presente. Equivocadamente se dá menos importância, ou pouca importância, ou quase nenhuma importância para a melhor parte da vida: o presente.

O presente é a melhor parte. Diria que é a única parte que realmente interessa, pois é o momento que se vive, é a própria vida que se desenvolve no presente. É no presente que tudo acontece. Nada acontece no passado e muito menos no futuro, pois ambos não existem como momento. Pode-se obter a imagem do passado, qual fotografia que leva a recordar momentos bons ou ruins, intensos ou despercebidos, ricos ou pobres. Do futuro, nem a imagem se tem: o que pode existir é a expectativa ou, quem sabe, o sonho. E todos sabem que os sonhos são apenas sonhos podendo tornarem-se em fatos somente no presente.

Então, o que são o passado, o futuro, o presente?

 

O passado


O que mais acontece no aprendizado é evocar os feitos próprios ou alheios acontecidos, ou seja, do passado. Se alguém fizer um balanço do que aprendeu durante os longos anos vividos nas salas de aula, perceberá que a maior parte do espaço foi preenchida na empreitada de decorar teorias criadas por cientistas, filósofos e outros grandes mestres.

São teorias corretas na maioria das vezes. Grande parte do tempo foi gasta no aprendizado da história universal, desde os fatos mais remotos até algumas décadas atrás, onde se rememoram os heróis, as grandes conquistas, as grandes guerras, a criação das nações modernas, etc. Existe quem imagina que franzir a testa e resgatar fatos ocorridos no passado é sinal de sabedoria. Povos perdem grande parte do seu tempo lembrando o passado. Dá-se tanta ênfase ao que ocorreu no passado que, muitas vezes, esquece-se de viver no presente.

Tudo isso tem sua importância. Mas não é só isso que é importante. Cultivar a inteligência de cada um e desenvolvê-la é extremamente importante.

É importante resgatar o passado. O nosso passado e o passado de nossos ancestrais, de nossos amigos de quem quer que seja. É a origem das origens do homem. Mais importante, porém, é que esse resgate permita que do passado se abstraiam experiências que contribuam para a construção e o aprimoramento do presente.

Cultivar em demasia as lembranças do passado pode provocar o abandono do presente. O passado já passou. O presente não, mas passará! Agarrar-se ao passado é deixar de viver o presente.

O passado é o conjunto de momentos presentes já vividos. Tudo o que se atribui ao passado nada mais é do que realizações executadas em momentos presentes que já vivemos.

O nosso passado, por exemplo, é como o nosso rastro, as nossas pegadas: lembram que por lá passamos, mas não resgatarão nossos pés. São a imagem de nossos pés, mas nunca os próprios pés.

Essa imagem, essa lembrança tem valor apenas se contribuir para que nossos pés atinjam o objetivo traçado. Assim é certo dizer que a lembrança do passado é a imagem do veículo que nos conduziu ao atual momento presente. Nada mais.

 

O futuro


O que é o futuro?
Todos aprendem que ele existirá, que é necessário se preparar constantemente para ele. Mas o que é o futuro? É possível preparar-se para o futuro? E alcançá-lo?

Disseram-nos, ainda, em nossa infância, que existem o passado, o presente e o futuro. E que a grande meta é preparar-se para o futuro. A vedete sempre foi o passado, onde se buscam os grandes exemplos, as grandes verdades, as grandes virtudes.

E o presente? Ficou esquecido. Talvez porque ele é mais complicado, porque exige mais, porque é o único momento que requer a nossa ação, a nossa decisão. Falar do passado é fácil, pois o homem não o possui. E quanto ao futuro..., bem, o futuro ainda não chegou, por isso, pode-se falar dele à vontade. Ninguém pode garantir que não acontecerá o que para ele se projeta. Mas, a exemplo do passado, o homem também não possui o futuro. Ninguém sabe se o alcançará.

Como momento, o futuro não existe. Aquilo que se denomina futuro é o momento presente seguinte ao atual. É o presente que sucederá a este presente: o próximo presente. Deixa de ser futuro para ser presente tão logo o atual presente passar. E assim sucessivamente. O futuro nada mais é que o próximo presente. E o atual presente, o próximo passado. Próximo não significa futuro? Então o presente é o futuro passado. Se próximo é futuro, então o próximo passado também é futuro.

O presente


O ponto central de tudo é o presente. O que se denomina passado já foi presente, nada mais é senão o presente já vivido. Quando vivermos o próximo presente (aprendemos a dizer que é o futuro), o atual presente se torna passado (porque não denominar de ex-presente?).

Se o homem não detém o passado e não alcançou o futuro, resta-lhe o presente. E é dele que menos se fala. Pouca importância se lhe dá. Talvez porque ele assusta mais do que o passado e o futuro juntos. Incrível: valoriza-se menos o presente, apesar de ser o único que a gente possui de verdade, que se detém, se domina, que se pode manipular, que permite construir, destruir, pensar, pelo qual se pode transformar tudo. É só no presente que se atua, que se ama. Impossível qualquer ação no passado e no futuro.

Será que quando as pessoas se detêm em demasia no passado e no futuro, em detrimento do presente, não estarão assumindo uma forma velada e erudita de fugir do presente e evitar a necessidade de assumir todas as suas nuances, as suas exigências e a obrigação constante de ser criativas para transpor todos os obstáculos que aparecem no dia a dia?

Se o passado é o conjunto de infinitos momentos presentes já vividos e que nunca mais retornarão, transformados em lembranças, a soma daqueles momentos vividos intensa ou lentamente, ou despercebidos, enfim, os inúmeros momentos que receberam o carimbo da existência do homem, o presente é o momento do pensar, da escolha, da decisão, do fazer, do realizar.

Não se vive o passado e do passado. Tudo o que dele se abstrai, só tem valor se usufruído no presente.

É no presente que se vive. É no presente que se tomam as decisões, que se erra, que se acerta. O que conta é o presente. É o exato momento. É o piscar de olhos. O presente é o momento que faz. O momento que realiza.

É no presente que se age. Se não se pode dominar o passado, porque se preocupar tanto com ele ou porque dar-lhe tanta importância? Se não se consegue ter qualquer ação sobre o futuro, para que ele existiria? Então podemos afirmar que passado e futuro não existem como momento, ou pelo menos não contam. Se o passado é a lembrança e o futuro a expectativa, o mistério e a ilusão, de positivo resta o presente.

O presente é o “momento zero”. Aquele que permite planejar, executar, viver. Ninguém consegue viver o passado, porque ele não “é”, não retorna (é possível apenas resgatar a sua lembrança). Tem-se apenas ação sobre aquilo que “é”. Nunca sobre aquilo que “foi”, ou que “será”, ou que “poderá ser”. Todos os atos são praticados no “momento zero”, porque é o único tempo que “é”. É no “momento zero” que o homem respira, se emociona, age, ama, odeia, cria, vive, realiza.

Ninguém consegue respirar, se emocionar ou agir nos momentos presentes já vividos - apelidados de passado - mas apenas no momento atual, no presente. O presente é um conjunto de etapas que se vive de forma ativa ou passiva, consciente ou inconsciente. A linha que limita e separa cada um dos momentos presentes é imaginária e não é óbice para se agir. Isso significa que não se sabe exatamente quanto dura cada momento presente. Não se conhecem os limites do presente, onde começa e onde termina. Também não se sabe quantas vezes começa e quantas termina.

É possível que comece e termine uma única vez: o momento do nascimento pode ser o início do presente, e a morte o seu término. O que é sabido é que nenhum momento já vivido pode ser revivido, por maior que seja o esforço, por mais desenvolvida que seja a tecnologia. O que se consegue é obter a sua imagem espelhada na sua lembrança. Essas lembranças podem ser muito próximas ou remotas. O momento vivido pode apenas ser lembrado, independentemente da intensidade com que tenha sido vivido.

É como olhar para a fotografia de nossos antepassados: por mais que os admiremos, ou os amemos, não poderemos resgatá-los para a vida presente por um único milésimo de segundo. Será apenas uma imagem que trará boas ou más recordações, que fará lembrar de bons ou maus momentos vividos.

O fim do presente e o começo do futuro. Daí surge outra pergunta: onde termina o presente e começa o futuro? Ou, ainda, onde começa o passado? Já se sabe que o futuro como momento não existe e que poderá existir apenas como o presente vindouro. É uma projeção, uma expectativa. Além de não poder ser demarcado, não se tem qualquer domínio ou qualquer ação sobre ele, porque toda ação possível ocorre no presente.

Pode-se propor ou idealizar tudo o que se quiser para o futuro, que ninguém poderá comprovar que não ocorrerá, porque o futuro é uma expectativa, e toda expectativa pode ser projetada para frente, mesmo que não tenha muitas chances de ser realizada. Se ficar estabelecida uma determinada data ou um determinado horário para ser o nosso futuro, este continuará sendo uma expectativa, e quando alcançado não será nada mais do que o presente de então.

Daí advém outra pergunta: se passado e futuro são inatingíveis, se sobre eles não se tem qualquer ação concreta ou qualquer domínio, para que serve a sua defesa, o seu cultivo? Se o passado é lembrança e o futuro expectativa, subentende-se que de pouco servem para o homem. Já se disse que as lembranças podem trazer benefícios somente se gerarem experiências ou fatos capazes de enriquecer as ações do presente. Essas ações, porém, são todas executadas no presente.

Para as lembranças terem sentido, devem ser capazes de indicar alternativas que auxiliem tomadas de decisões presentes. Já as expectativas são sempre incógnitas: estima-se que as ações poderão ser tomadas, mas em outros momentos presentes ainda não atingidos. Não se tem o domínio sobre elas. Têm-se a expectativa de executá-las, mas nenhuma certeza de execução.

As economias ou tesouros amealhados nos tempos presentes já vividos, frutos de trabalho e estratégias, só podem ser desfrutadas no presente. Ninguém desfruta ontem aquilo que só obterá hoje. Ninguém tem certeza de gastar amanhã algo que possui hoje, se não sabe sequer se para ele existirá o amanhã. E o amanhã, quando alcançado, será o próximo hoje, portanto, o mais novo presente, o futuro passado mais recente.

Da mesma forma como o passado não pode ser retomado, o futuro nunca será alcançado, pois se for estabelecido um momento definido como sendo o futuro, ao ser alcançado se tornará presente. Por isso é certo afirmar que, no plano material, o futuro não existe como momento, mas apenas como expectativa, ou como mistério. Alguém (não lembro quem foi) já disse que “o passado está morto, o futuro uma incógnita, e o agora é uma dádiva, por isso o chamamos de presente”.

Passado e futuro só podem ser concebidos e entendidos a partir do presente. Dependem em tudo do presente. O passado é a lembrança, o arquivo. O futuro apenas a expectativa, o sonho, a vontade.

As lembranças podem ajudar. É salutar lembrar episódios do passado, exemplos vividos, experiências arquivadas e disponíveis à visitação. Isso pode trazer conforto, facilitar a tomada de decisões com mais segurança, alertar sobre erros cometidos e ajudar a evitar que se repitam. Tudo o que está arquivado no passado fez parte de algum momento presente deixado para trás (o que não trilhou por esta senda é lenda, ilusão, invenção ou mentira). Por isso, ao rememorar esses feitos, percebe-se que a maior parte deles permanece no esquecimento. A mínima parte é trazida à tona.

Provavelmente isso ocorre porque esses feitos não foram muito importantes, e pouco ou nada podem contribuir para o presente. Se não são importantes, não vale a pena buscá-los. Se buscados, deve ser com a finalidade de contribuir para o aperfeiçoamento do presente.

Idêntica argumentação pode ser aplicada a tudo o que diz a respeito ao futuro. As pessoas aprenderam a se preparar constantemente para o futuro, mas ninguém disse quando será o futuro e, tampouco, quanto tempo durará e muito menos por quanto tempo esse futuro deve ser preparado e com qual intensidade. Alguns acreditam que o futuro é a outra vida, alcançada após a morte. Outros, céticos, não acreditam sequer nessa outra vida. O que é certo é que o futuro não está ao nosso alcance, pelo menos como momento presente.

Aperfeiçoar o presente. Desta forma, partindo-se do princípio de que o passado não retornará jamais, e que o futuro não está ao nosso alcance, voltemos ao presente. Este pode ser conhecido, vivido. É nele que tudo acontece, que se busca a sabedoria, que se ama. Nada melhor para coroar o passado, do que viver intensamente o presente. Por esse caminho se prepara tanto o futuro mais próximo quanto o mais distante, ambos representados pelos próximos momentos presentes.

É importante fazer de cada momento presente um perene aperfeiçoamento do próprio presente, amadurecido com o passar dos anos lembrando que, como momento material, ele começa com o nascimento e termina com a morte. Aí desaparecem o presente, o passado e o futuro materiais para dar lugar à vida exclusivamente espiritual.

Aperfeiçoar o presente significa, sobretudo, negar-se a aceitar que tudo já foi pensado, criado, realizado, e que somos meros plagiadores daqueles que nos antecederam. Aceitar passivamente teorias já formuladas no passado, mesmo que estejam matematicamente corretas, será negar nossa capacidade criativa, nossa inteligência.

É preciso romper paradigmas, desenvolver as potencialidades e buscar alternativas para a execução das ações decorrentes das teorias já inventadas.  Não existe uma única alternativa para a solução de qualquer problema ou enigma. Será a criatividade como ação no momento presente que poderá alcançar resultados incríveis e inéditos.

Esta capacidade criadora infinita, inerente ao homem, deve ser cultivada no dia a dia. Acomodar-se na aceitação do que já foi dito e definido não é aperfeiçoar o presente, mas adormecê-lo, condená-lo.

Valorizar o presente. Daí a importância de valorizar o presente, o que existe de verdade. O passado não é tão importante. Ele não existe mais como algo que permita qualquer ação. Apenas existiu - quando era presente. A preparação do futuro - se é que se pode preparar o futuro, pois sequer sabemos quando ele começará - se dá vivendo o presente com toda a intensidade.

Por isso, preocupar-se com o presente é a melhor maneira de dizer que se viveu de acordo com o que nos foi exigido ou nos propusemos desde o começo. Esconder-se nos arquivos do passado ou na expectativa do futuro é perder tempo, é não viver adequadamente, é deixar de construir, é fugir da realidade. Viver intensamente o presente é valorizar o futuro passado e garantir um próximo presente ainda mais promissor.

Evocar menos o passado e deixar de preocupar-se tanto com o futuro e, em conseqüência, viver voltado para o presente aperfeiçoando-o cada vez mais, é a verdadeira maneira de viver.